sábado, 6 de novembro de 2010

Jello Biafra dá aula de história contemporânea com a Guantanamo School of Medicine em SP

Uma das personalidades de discurso mais combativo na história do rock’n roll, o ex-líder do grupo estadunidense Dead Kennedys Jello Biafra fez um show memorável no início da turnê brasileira de sua nova banda, a Guantanamo School of Medicine (Escola de Medicina de Guantânamo) nesta sexta-feira (5) no Hangar 110, em São Paulo.

Durante aproximadamente uma hora, Biafra promoveu o repertório do disco de estréia da nova banda, “Audacity of Hype” (2009), junto a temas clássicos de seus projetos pregressos, como o já-citado Dead Kennedys e Lard.

É a segunda vez que Biafra se apresenta no Brasil, dezoito anos após duas legendárias aparições no Rio de Janeiro (seguida de uma em SP) com o Mano Negra (banda que despontou Manu Chao), Lard e um combo misto de Sepultura e Ratos de Porão em 1992, em plena decorrer da ECO-92, congresso multinacional que discutia questões voltadas à ecologia e políticas internacionais.

Jello Biafra entrou no palco vestido de cirurgião psicopata, com manchas de sangue cenográfico pelo corpo. Assim que tirou o uniforme de profissional da Saúde, o cantor apresentou um modelito chiquérrimo com a bandeira de um antigo império mesopotâmio, para o deleite de carnavalescos e apreciadores de moda e estilo. Após alguns números, tirou as fantasias e vestiu uma camiseta preta com os dizeres "Democracy We Deliver", a mesma que alguns também usavam entre a audiência.

Temas como “Clean As A Thistle”, “New Feudalism”, “Three Strikes”, “The Terror of Tinytown”, “Pets Eat Their Master”, "Dot Com Monte Carlo", "Bozo Skeleton", “Let’s Lynch the Landlord” e “California Übber Alles” foram destaques do show – esta última com direito a stage dive de JB, que cantou parte da música nos braços de seu público. Formação menos afeita a experimentações sonoras que suas demais incursões musicais pós-DK, a Guantanamo School of Medicine nesta excursão difere da presente em seu disco de estréia. No entanto, isso não faz diferença em termos de impacto sonoro.

Rock de Combate
Jello Biafra foi comedido em seus já famosos discursos, porém não poderia ser menos incisivo. Criticou as políticas monetárias do capitalismo internacional, a gentrificação (enobrecimento urbano ou espécie de eugenia comportamental comum entre os senhorios e manda-chuvas da especulação imobiliária nos EUA, que se desfazem de inquilinos que atendem requisitos menos afeitos ao esquema TFP), os estragos provocados pela privatização do sistema prisional em seu país, dentre outros temas caros a uma nação tão sujeita a influências tal como se tenta nos impingir à revelia sob a desculpa da conversinha fiada do ônus do neoliberalismo e da globalização.

Não bastasse o momento mais que propício para uma apresentação deste tipo em nosso país, Jello Biafra passa por um momento muito luminoso em sua trajetória.
Portanto, é uma oportunidade atípica para os brasileiros que não tiveram idade ou oportunidade para ver os Kennedys ainda ativos, banda que felizmente não mais voltará à ativa desde o processo litigioso que seus ex-integrantes perpetraram no século passado contra o líder da banda – notório compositor de todos os temas, embora não seja músico de formação. Vale lembrar que os litigantes chegaram ao disparate de promoverem uma excursão sem Jello Biafra em 2002 sob a alcunha de DK Kennedys, com direito a vergonhosas apresentações no Brasil apresentando repertório clássico do DK, ao ponto de o baixista do De Falla, Flu, ter veladamente feito às vezes de “músico estrangeiro”, para a diversão dos que o conheciam de outras bandas.



O acaso também contribuiu para esta noite memorável de rock’n roll. Durante o número de encerramento, “Holiday in Cambodja”, aconteceu um inesperado blecaute – o que levou à platéia a chamar para si a responsabilidade de finalizar o espetáculo cantando em uníssono o clássico tema romântico original do Dead Kennedys, acompanhada apenas pela bateria (assista ao vídeo acima). De início, especulava-se que seria uma represália da casa de shows a fim de encerrar os trabalhos antes da meia-noite. Porém, após o encerramento do set, ficou-se sabendo que a pane na energia elétrica não aconteceu apenas na casa de show, mas sim no bairro inteiro à sua volta.

Diferentemente de outras regiões da cidade, o bairro do Bom Retiro, na zona central de São Paulo, não contou com a chuva forte que despontou em outros pontos da cidade.



RxDxPx volta à ativa
Os veteranos do Ratos de Porão fizeram o show de abertura desta primeira noite da turnê brasileira da Guantanamo School of Medicine e apresentou seu set repleto de clássicos como “Aids, Pop, Repressão”, “Amazônia Nunca Mais”, “Sistemados pelo Crucifa” (hihihihic) e a recente “Exército de Zumbis. O Hangar 110 ainda recebe Jello Biafra e sua banda para mais uma apresentação neste sábado (6), com a abertura do grupo Flicts. Na seqüência, a tour segue para o Rio de Janeiro, no Circo Voador.



PS: Este texto foi originalmente concebido em português pré-Acordo Ortográfico.

PS: Agradecimentos especiais ao fotógrafo que me deu de presente um par de pilhas, pois o “profissa” aqui não se lembrou de levar as pilhas carregadas de casa, inestimáveis para que este mulambo aqui pudesse fotografar com sua xereta digital. Foi mal, mas não lembro do teu nome. Dificuldade nata de lembrar nome de macho... :D

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